Em 1 ano, quase 300 pessoas que passaram por audiência de custódia na Capital estavam em situação de rua


Texto: Danielle Valentim

A Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul, por meio do Núcleo Criminal (Nucrim) e Coordenadoria de Pesquisas e Estudos (CPES), divulga a 1ª edição da Pesquisa Custódia Pop Rua. O relatório traz um recorte inédito em alusão ao Dia Nacional de Luta da População em Situação de Rua, celebrado no dia 19 de agosto.

A data faz referência ao “Massacre da Sé”, em 2004, quando sete pessoas em situação de rua foram assassinadas a tiros e oito feridas gravemente enquanto dormiam na Praça da Sé, no centro de São Paulo. Desde então, a data tem como objetivo conscientizar a sociedade sobre o respeito aos direitos humanos e atenção necessária a essa parcela da população.

O material especial da Defensoria traz o perfil dessas pessoas presas em flagrante e que foram apresentadas ao juiz dentro de 24 horas em Campo Grande, entre 1º de julho de 2022 e 1º de julho de 2023. O relatório aponta que de 3.484 audiências de custódia realizadas no período, 276 pessoas estavam em situação de rua, o valor representa 8% sobre o total de audiências.

Neste período, das 276 pessoas em situação de rua, 271 foram defendidas pela Defensoria Pública.

O quantitativo total e exato de pessoas que passaram por audiência de custódia não é conclusivo no material divulgado, haja vista a possibilidade de uma pessoa ter passado mais de uma vez pelo ato.

Conforme o coordenador do Nucrim, defensor público Daniel Calemes, o material foi preparado dentro do calendário de levantamentos do Núcleo e estrategicamente com relação à data nacional.

“Estar na rua já é a marca do estigma e da exclusão dessas pessoas e esta razão nos motivou a realizar o levantamento, porque é um público que tanto o Nucrim como o Núcleo dos Direitos Humanos atende com frequência. Este recorte especial em alusão à data nacional promove um levantamento inédito e garante um panorama de todas as custódias realizadas em Campo Grande, de quantas pessoas que “moram na rua” dentro de um ano foram presas e passaram por audiência de custódia, de quantas praticaram crimes violentos, o grau de vulnerabilidade de cada um, qual a decisão do juiz, dentre outros fatores. E por ser a primeira também vai garantir uma base para atenção e acompanhamento contínuo deste grupo”, destaca o coordenador do Nucrim.

O relatório

Das 276 pessoas analisadas, 78 pessoas tinham entre 30 e 34 anos e apenas cinco possuíam mais de 60 anos no momento da prisão flagrante. Do total, 186 não possuíam documentos e apenas uma era de nacionalidade paraguaia, sedo o restante brasileira.

Do total analisado, 168 se autoidentificaram como pardas, 66 brancas, 40 como pretas, uma como amarela e uma como indígena. Do número integral do grupo, 249 pessoas se identificaram do gênero masculino, 22 feminino e cinco delas na população LGBTQIA+.

Com relação à situação ocupacional, 118 faziam bicos no momento da prisão e 87 estavam desempregados. Apesar da situação de rua, dois possuíam registro em carteira.

Com relação à escolaridade, 178 possuíam apenas o ensino fundamental incompleto, dois o ensino superior completo e quatro eram analfabetos funcionais.

Família – O perfil dos presos e presas em flagrante mostram que 235 estavam solteiros, 21 em união estável, 13 divorciados e sete casados. Do total, 143 possuem filhos e apenas nove são parcialmente responsáveis pelo sustento. Deste total, 50 possuem filhos menores de 6 anos e 61 disseram que os filhos têm entre 6 e 12 anos. Das 276 pessoas, apenas uma pessoa estava gestante no momento da prisão.

Saúde – As informações gerais do relatório apontam que 50 pessoas deste grupo possuem doenças, sendo 35 portadores de doenças que exigem controle, 15 de doenças infectocontagiosas e apenas um com doença que não exige controle. Ainda neste recorte, 14 realizam tratamento de saúde e 18 fazem o uso de medicação. Do total, três são pessoas com deficiência física.

Uso de drogas – Das 276 pessoas, 235 fazem o uso de substâncias psicoativas, sendo 208 de pasta base, 48 de álcool, 33 de maconha, 26 de cocaína e 22 de crack. No grupo, 137 estava sob o efeito de substâncias psicoativas durante a prisão. No grupo, 240 disseram desejar passar por tratamento, sendo que 134 já fizeram tratamento.

Outro dado é com relação aos benefícios do governo, 244 pessoas não recebem nenhum tipo de auxílio financeiro. Das 31 pessoas que afirmaram receber, 22 são o Auxilio Brasil, quatro o Bolsa Família, dois o LOAS e um do INSS.

Informações criminais e processuais – Neste recorte do levantamento das 276 pessoas, 57 afirmaram ter sofrido violência policial física, verbal e psicológica durante a abordagem, sendo que 10 afirmaram também ter sofrido violência policial física, verbal e psicológica na delegacia.

O material do Nucrim também aponta que enquanto 113 eram reincidentes, 163 eram primários. Do total, 231 pessoas foram presas por crimes sem violência ou grave ameaça, mesmo assim, 148 tiveram a conversão da prisão em flagrante em preventiva sob o fundamento de garantir a ordem pública, assegurar a aplicação da lei penal e perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.

Coordenador do Nucrim, defensor público Daniel Calemes. 

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