O Diretor do SISTA-MS e Superintendente Estadual do Ministério da Saúde em Mato Grosso do Sul, Dr. Ronaldo Souza participou na Câmara Municipal de Campo Grande da audiência pública que colocou em debate o uso e a aplicação medicinal do Canabidiol. A audiência “Cannabis Medicinal: Direito à saúde, associativismo e impacto social”, contou com a presença de especialistas e autoridades que discutiram a construção de políticas públicas adequadas para garantir o acesso seguro e eficiente ao tratamento com a Cannabis.
A audiência foi feita pela Comissão Permanente de Ciência, Tecnologia, Inovação e Empreendedorismo, composta pelos vereadores Tabosa (presidente), Ronilço Guerreiro (vice), Dr. Jamal, Luiza Ribeiro e Dr. Loester. Foi debatido o aspecto político, social, jurídico e científico, além de apresentar o impacto social do trabalho de associativismo em Mato Grosso do Sul.
Desde fevereiro deste ano tramita na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul (ALEMS) o PL 06/2023, que assegura o acesso a medicamentos e produtos à base de cannabis para tratamento de doenças, síndromes e transtornos de saúde, de autoria do Deputado Estadual Pedro Kemp.
Veja a entrevista com o Diretor do SISTA-MS, Dr. Ronaldo de Souza Costa
Observatório – Quais são os usos comprovados de remédios à base da Cannabis Sativa?
Dr. Ronaldo de Souza Costa – A Cannabis Sativa é uma vegetal que tem a possibilidade de gerar várias substâncias, e entre elas o Canabidiol ou CBD. O Canabidiol tem sido pesquisado testado e utilizado para tratamento de diversas patologias, porque age no Sistema Nervoso Central, reduzindo ativação de células da Glia, do Sistema Nervoso, que quando entram em processo de hiper excitação provocam alterações graves, que provocam morte do neurônios. Uma dessas manifestações mais graves são as convulsões, refratárias, de difícil controle.
Muitas outras manifestações decorrentes de hiper excitabilidade de células do Sistema Nervoso Central já possuem experiências de uso e podem ser indicações de uso da Cannabis Medicinal ou Canabidiol, como o Mal de Parkinson, o Mal de Alzheimer, os vômitos secundários à quimioterapia, distúrbios do movimento e do sono, e casos graves de ansiedade, transtornos do pânico.
Em epilepsia, onde o uso já é comprovado, qual é o benefício? Em epilepsias refratárias, de difícil controle, a indicação clínica e os benefícios do uso estão comprovados, com resultados excelentes, em pacientes que possam usar, que não tenham intolerância ou efeitos adversos ao Canabidiol.
Observatório – Existem estudos que dizem que os efeitos do canabidiol não seriam tão diferentes dos de outros analgésicos como a codeína, como você vê essa afirmação?
Dr. Ronaldo de Souza Costa – Os medicamentos, para terem indicação precisam terem estudos da farmacodinâmica e da farmacocinética. A farmacodinâmica estuda a interação do medicamento com os locais de ligação, os receptores, nesse caso mais seletivo do canabidiol, os receptores neuronais, as células do sistema nervoso. A farmacocinética estuda o caminho que a substância faz no organismo, desde sua ingestão à sua eliminação. O Canabidiol para ter uma ação analgésica adequada, a contento, precisaria se ligar aos receptores neurológicos responsáveis pela dor, inibindo a formação de substâncias que provocam a dor, ou ocupando o lugar de ligação dessas substâncias, como citocinas e prostaglandinas. Nesse momento o uso do canabidiol não tem estudos quantitativos e qualitativos que comprovem essas ações, com consistência e segurança científica.
Observatório – Como uma pessoa hoje pode ter acesso aos medicamentos à base de CBD? Mediante Prescrição Médica de Controle Especial o Canabidiol já pode ser encontrado em farmácias, com nomes comerciais específicos.
Dr. Ronaldo de Souza Costa – A liberação da Anvisa traz algum risco de produção da droga recreativa? A liberação pela ANVISA não gera risco de uso recreativo do medicamento, porque exige Prescrição Médica de Controle Especial. Agora, a possibilidade de fornecimento de prescrições sem indicações clínicas passa a ser um problema ético sob gestão do Conselho Federal de Medicina. O médico pode prescrever uma medicação se a substância tiver indicação, e se for a melhor opção de tratamento para o paciente.
Observatório – A droga recreativa conhecida popularmente como maconha, que nada tem a ver com o canabidiol, tem efeitos maléficos?
Dr. Ronaldo de Souza Costa – A Canabbis sativa ou maconha no estado de erva natural , ao ser queimada produz aproximadamente 61 substâncias, dentre elas o o Delta 9 tetraidrocanabinol, que produz efeitos psicotrópicos, alterações do humor, alterações da percepção, alterações da motivação, alterações da coordenação e do tempo de reação/reflexo, alterações da aprendizagem, alterações da memória, alterações no processo de encadeamento dos pensamentos, volubilidade e aumento da fome, aumento do prazer sexual… Não existem estudos que comprovem que o uso da maconha causem efeitos deletérios permanentes no cérebro, havendo recuperação pelna das funções com a interrupção do uso.
Observatório – – Algo mais?
Dr. Ronaldo de Souza Costa – A Ciência precisa não pode ser pautada pelo preconceito, pelo fundamentalismo religioso, pelo tradicionalismo político, pelas formas impositivas de dominação, até porque, essa mesma sociedade que se arma com preconceito e discriminação permite e faz propagandas do álcool, do tabaco, da gordura, do açuçar, do sal, dos alimentos ultraprocessoados, dos alimentose das águas com agrotóxicos, ainda permitindo e convencionando níveis de tolerância para a quantidade de veneno que se come e que se bebe, e ainda pior, não tem instrumentos de controle, nem vigilância sanitária suficiente para coibir todas as atrocidades legalmente permitidas que expõe a população à fatalidade desses riscos causadores de adoecimento e morte.
Currículo do Ronaldo de Souza Costa
Ronaldo de Souza Costa, nascido em 03.10.1962. Filho de Zelinda de Souza Costa e João Antônio da Costa.
Natural de Santa Cruz de Monte Castelo – PR.
Graduado em Medicina pela Universidade do Rio de Janeiro, Pós Graduado em Medicina do Trabalho pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Especialista em Medicina do Trabalho (Associação Nacional de Medicina do Trabalho – ANAMT). Especialista em Clínica Médica (Sociedade Brasileira de Clínica Médica)
Enquanto estudante foi fundador e ex-dirigente (Vice-Presidente de Finanças e Coordenador Regional Sudeste da Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina-DENEM), cujo lema à época da fundação era “Basta de Aprender nos Pobres para só Curar ao Ricos”.
Partícipe ativo desde 1984 do Movimento da Reforma Sanitária pela consolidação de um Sistema de Saúde Único, Estatal, Gratuito, de Qualidade e com Equidade em todos os níveis de complexidade para todos os brasileiros e brasileiras, de forma a garantir a “Saúde um Direito de Todos e um Dever do Estado.
Desde 2001, quando chegou em Mato Grosso do Sul defende a implantação do SUS com uma rede de atendimento própria Sistema Público de Saúde em MS, sem a compra de serviços privados e sem terceirização de serviços, como forma de otimizar o orçamento, valorizar os profissionais e aumentar a oferta de serviços à população.
Foi criador, junto com William Waissman (CESTEH/FIOCRUZ), do Projeto CIVITTOX (Centro Integrado de Vigilância Informação e Tratamento em Toxicologia – CIVITTOX) no Hospital Regional, oferecendo atendimento em caos de intoxicação agudas e crônicas, com processo de capacitação/treinamento em serviço, progressivo de toda a equipe, através da demanda. Hoje o projeto original foi desestruturado.
Foi criador do Primeiro Projeto do CEREST Estadual, o CEREST Regional de Campo Grande, inicialmente denominado CRESAT, unidade integrante da Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador (RENAST) para oferecer atenção integral à Saúde do Trabalhador com toda a equipe de profissionais. Os CEREST’S se multiplicaram em unidades regionais e estão habilitados em mais dois municípios do Estado.
Tanto o Projeto CIVITTOX quanto o Projeto CEREST tinham e têm objetivos de oferecer assistência qualificada à população exposta às substâncias químicas relacionadas ou não ao trabalho, sendo o CEREST direcionado especificamente para a Saúde do Trabalhador.
Participa ativamente de movimento que reivindica a instalação de Laboratório Estadual (e regionais) de Análises de Resíduos Químicos e Toxicologia, de forma a garantir abrangência e complexidade do tamanho do estado de MS, com a rapidez necessária, e segurança para os diagnósticos de acidentes químicos com pessoas e com o ambiente, de forma a garantir em tempo o tratamento e as medidas necessárias para evitar acidentes ampliados.
Foi Coordenador Regional de MS e Coordenador Nacional da Medicina do Trabalho dos Correios, a maior empregadora do Brasil, com mais de 100.000 empregados públicos.
Atualmente é Superintendente Estadual do Ministério da Saúde em Mato Grosso do Sul e Médico na UFMS, atuando na Saúde Ocupacional e Segurança do Trabalho / Saúde do Trabalhador, do Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian.